Na Semana Nacional do Excepcional, é importante falar sobre acessibilidade e entender que essa não se restringe apenas aos meios físicos. Acesso à convivência social é tão importante quanto e, para garantir essa convivência, é preciso respeitar as limitações de cada um. Para que isso ocorra, obrigatoriamente precisamos de uma mudança comportamental, pois estamos falando de pessoas. E quem de nós não gosta de conviver, estar inserido no meio, participar de eventos? Quem de nós não gosta de respeito e carinho? Quem de nós não gosta de credibilidade? Precisamos quebrar barreiras e aceitar realmente as diferenças, um exercício que precisa ser praticado com frequência e amor. É claro que a vida não é uma receita de bolo, mas existem ingredientes essenciais como o respeito.
Assim, quero te contar uma história de aprendizado. E quando você achar que já aprendeu muito, será surpreendido e verá que tem muito mais para aprender. Muitas pessoas do meu convívio já conhecem a Maricota do meu coração. Desde bebê, nós desenvolvemos uma empatia mútua. E essa tia, que na verdade é prima, aprende com ela em cada momento da nossa convivência, especialmente naqueles dias em que seus pais nos permite dar nossos passeios.
Desde pequena, a Maria Fernanda ficava me observando quando, com as minhas mãos, eu fazia para ela um coração. Assim, como os corações feitos por mim, os delas tiveram vários formatos, mas não deixavam de ser entendidos. E cada uma de nós, respeitando as nossas limitações, fomos aprendendo a dar uma forma mais parecida para aquilo que entendíamos por coração. E com essa brincadeira eu aprendi a ter paciência para esperar o tempo dela e compreender que de formas diferentes estávamos falando do mesmo amor. A lição que se tira é que de uma forma diferenciada da convencional podíamos nos conectar.
Respeitando o seu tempo, Maria aprendeu a falar e eu achava maravilhoso ser a Tia Ju, até que em um de nossos passeios estávamos no carro, ela na sua cadeirinha e eu no banco do motorista, prontas para fazer a nossa “selfie”, ouço: “Faz a nossa foto, amada!”. Definitivamente eu me emocionei, mas na minha ignorância pensei que ela talvez não tinha compreensão do que falava. Então, perguntei: “você sabe o que é amada?”. Ela sem rodeios disse que era quem ela amava, a sua tia do coração. Confesso que quase chorei, pois aquele pinguinho de gente já sabia mais sobre o amor do que muitos de nós. E a tia do coração também era uma referência aos corações que fazíamos uma para outra.
A Maricota é uma caixinha de surpresas. Lembro-me de um dia quando ela fez uma travessura e eu lhe disse que aquilo não era educado, que não podíamos machucar as pessoas. Ela se virou para mim e disse: “desculpa, amada?”. Lembro-me de subir as escadas, com cara de brava, e ir para quarto assistir um filme. Ela seguiu o mesmo caminho, subiu em minha cama e disse: “eu entendi, podemos assistir nosso filme?”. Quando Maria começou a ler, eu mencionei que daria um livro para ela para que lesse e me contasse a história depois. A mãe da Maria me ensinou um pouco sobre as letras que seriam mais fáceis para sua leitura. Um tempo depois, achei um livro adequado e entreguei a ela. Em um belo dia, Maria me liga e me diz: “amada, quero te contar uma história”. Quando ela começou a contar, eu me lembrei do nosso combinado.
São muitas histórias vivenciadas e muitas contadas por ela sobre mim, a sua “amada”. Eu já estava tão famosa na escola que fui buscá-la algumas vezes para ela me fazer de vitrine. Todos do nosso meio já conhecem a amada sob a ótica da Maria e aqueles que me conhecem já se sentem íntimos da Maricota. Ela é uma presença marcante na minha vida, que me ensina e inspira a cada dia, afinal ainda não tenho filhos e ela me acompanha até nos aniversários de crianças.
Falar um pouco da Maricota, com a devida permissão dos pais, se faz necessário para frisar que quando rompemos nossos preceitos convencionais deixamos o amor nos contagiar. Que acessibilidade não se resume apenas às barreiras físicas e sim às barreiras que criamos para o convívio. Direcionar a minha linguagem para meu ouvinte é sinal de respeito, mas aprender a ouvir e tentar compreender as diferentes formas de construção de ideias é essencial, pois o respeito só acontece quando entendemos que existe muito mais do que o convencional. Eu espero poder aprender muito mais e que ela possa trilhar o seu caminho sabendo que se precisar eu estarei aqui, pois o que te torna especial é essa alegria e força que me contagia. Amo você e espero poder aprender muito mais para que possamos romper mais barreiras e sermos mais úteis para outras pessoas em suas batalhas.
Imagens: Arquivo Pessoal / Com Autorização dos Pais